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Foto do escritorAndreia Ferreira Campos

Ler Transforma Integralmente


O mundo apresenta desafios de complexidade que se traduzem em mais conhecimento aplicado em todas as áreas da vida. Seja no seu trabalho ou na sua vida pessoal, a quantidade de tarefas que faz requer a ativação de todas as redes neurais do seu cérebro em sequências e sincronias que fazem inveja a qualquer sinfonia criada pelos melhores músicos. Será que a leitura contribui para nos dar uma vantagem competitiva nesta ativação neural complexa? Ler transforma integralmente, contudo terão todas as leituras têm o mesmo efeito? E que efeito é esse? Venha descobrir a resposta da ciência.

 

A mais antiga biblioteca, datada do segundo milénio a.C., em Thebes no Egito, tinha um letreiro no topo do portal onde se lia: “lugar de cura para a alma”.


A ideia de que ler tem benefícios de cura não é nova, mas continua a surpreender.


Não bastaram todas as restrições à aprendizagem da leitura e escrita das mulheres durante… sei lá quanto séculos… foram muitos. E as repetidas afirmações de que uma mulher que lê é perigosa. Ou até mesmo, a proibição de ler e escrever que era imposta aos escravos. O medo de que o acesso ao conhecimento mudasse a perspetiva das pessoas, que as curasse dos mitos que impunham a ordem social era transversal a homens e mulheres de várias civilizações.


As estruturas sociais dependiam da manutenção de um determinado estado de coisas. Todos sabemos como as pessoas precisam de guerras do tipo nós-contra-eles para valorizar vidas desprovidas de significado maior. As guerras de classe são as mais constantes e, atualmente, as menos reconhecidas, embora persistam ativas.


Vivemos na era em que o conhecimento está acessível a todos, ou quase, e temos vindo a registar aumentos significativos nos níveis de leitura de livros entre jovens e nas restantes faixas etárias. No entanto, a percentagem da população que não lê livros, ainda é maioritária.


Os livros que são um bálsamo para a alma são livros de ficção, poesia e narrativas de não-ficção (que incluem memórias/biografias).

O apelo da catarse emocional pela leitura é intuitivamente aceite. Será verdade? Ou lemos apenas por interesse, prazer, escape – ou amor pelas palavras?



Para que lemos?


A leitura é uma das formas que temos de compreender os nossos mundos. Psicólogos evolucionistas propõem que o cérebro está desenhado para ler, tal como está estruturado para a linguagem, reconhecimento facial ou outras motivações instintivas.


Ler envolve tanto os processos cognitivos como processos emocionais, principalmente quando o texto é narrativo. Ler leva a criar e expandir significados. Quando falamos de significados estamos a entrar no domínio do espirito.


A criação de significados ou compreensão do mundo pode ocorrer diretamente através da aquisição de conhecimento (por exemplo, quando lemos um manual técnico) ou pelo envolvimento com o meio social, a arte e as nossas capacidades linguísticas de criação de significado.


As obras de arte convidam o pensamento e o sentimento a uma interação sinérgica.

Todas as obras de arte requerem uma leitura. Esta comunicação indireta na literatura é um dos benefícios que oferece aos leitores.


A criação de significados é a transação entre autor, texto e leitor; a dessincronização entre as palavras e a interpretação, moldadas pelas experiências e predisposições que quem lê, são críticas.


Ler, como uma capacidade inscrita na nossa natureza humana e uma forma de nos envolvermos com a arte, permite-nos processar as nossas emoções.


Através da leitura temos acesso a experiências que não vivenciamos, e os sentimentos positivos que elas produzem permanecem connosco.



O que acontece no cérebro quando lemos?


Duas redes neurais distintas, no lobo frontal e no lobo temporal, são ativadas e trabalham em uníssono para integrar o significado das palavras e obter uma ordem mais elevada e complexa de significados quando lemos.


Os significados das palavras ativam ainda as redes sensoriais, como se estivéssemos a sentir as emoções sobre as quais estamos a ler.


Os nossos cérebros estão totalmente interconectados, e para compreender linguagem requerem uma sequência precisa de processos dinâmicos rápidos a ocorrer em múltiplos locais por todo o cérebro.

Quanto mais complexa for a linguagem, maior o número de áreas do cérebro envolvidas no processamento, maior a ativação neural. Para os leigos das neurociências, isso traduz-se no uso de maior potencial humano, mais capacidades que emergem com o uso recorrente e se tornam competências.


Impacto para as crianças


Estudos recentes confirmam que encorajar as crianças a lerem por prazer pode aumentar a sua capacidade cognitiva e a saúde mental durante a adolescência.


Pesquisas sugerem que 12 horas de leitura por semana é a duração ótima, que contribui para melhorar a estrutura do cérebro e a saúde mental.



O prazer de ler impulsiona as aprendizagens verbais, memória, e o desenvolvimento da linguagem. Mostra ainda sinais de reduzir o stress, a depressão, e alterações de comportamento.


Factos Chave:

  1. Leitura precoce, por prazer, mostra uma forte correlação positiva com desenvolvimento cognitivo e bem-estar mental em adolescentes.

  2. Uma duração ótima de 12 horas de leitura por semana parece beneficiar jovens leitores, com benefícios para além da adolescência.

  3. Leitores adolescentes apresentam maiores áreas e volumes cerebrais, especialmente em regiões ligadas às funções cognitivas e saúde mental.



O impacto das dificuldades de aprendizagem de leitura e escrita nas crianças e jovens tem custos sociais gigantescos. Não ter uma leitura funcional condiciona as opções profissionais, a participação na sociedade (nos serviços disponibilizados pelos sistema, e também nas obrigações que o sistema nos impõe). Condiciona a saúde mental e física em geral.


Por cada criança que não aprende a ler, por cada adulto que não gosta de ler, os gastos em saúde e segurança social para o estado aumentam exponencialmente. Esta é uma aposta em educação que não pode deixar de ser feita. A qualidade da escola pública no ensino básico precisa de uma visão de futuro, uma transformação que não pode ser adiada sob o risco de este ser mais um preço que todos iremos pagar no futuro próximo.


Uma das formas de diminuir a pressão no sistema nacional de saúde é investindo nas competências de literacia das crianças. (Uma das formas! Problemas complexos requerem mais do que uma solução!)


Uma das formas de os adultos potenciarem o seu desenvolvimento integral é construindo hábitos de leitura sólidos, que os ajudem a processar as suas emoções e a educar as crianças que estão ao seu cuidado a serem também elas leitoras e humanos em constante transformação pessoal.


Ler mais contribui para a construção de uma sociedade mais evoluída, pelo desenvolvimento integral que cada pessoa promove nos contextos em que a sua vida se concretiza.


Viva integralmente.

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